Entenda os riscos psicológicos às crianças após separações


Correio do Estado

Segundo especialistas, a alienação parental pode aparecer por meio de frases, mas também com proibições e até falsas denúncias; este último caso é frequente na atualidade - Foto: Divulgação

“Sua mãe não deixou eu falar com você”; “Seu pai não envia o dinheiro da pensão”; “Sua mãe é irresponsável”: frases comuns, ditas às crianças e aos adolescentes, tanto pelos pais quanto pelas mães, para atingir o ex-companheiro ou ex-companheira. Apesar de rotineiras, essas falas podem induzir os filhos a rejeitar uma das duas partes e gerar consequências desastrosas para o relacionamento dos três e, principalmente, para o desenvolvimento de quem está crescendo em meio a essa situação.

Em tempos em que o número de divórcios é crescente – aumentou pelo menos 160% entre 2003 e 2013, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) –, dividir os cuidados dos filhos e manter uma convivência harmoniosa com o ex é um desafio para os pais que moram em lares diferentes. Não raramente, acabam praticando a alienação parental, identificada como o ato de desqualificar o ex-companheiro ou outro responsável para os filhos. Ela pode acontecer não só por meio de frases, mas também com proibições e até falsas denúncias.

Quando existe abuso psicológico da criança e não há mais possibilidades de diálogo, a psicóloga Andreia Calçada defende a interferência do Judiciário. Ela é especialista em questões familiares, atua no Rio de Janeiro (RJ) e esteve em um evento jurídico em Dourados na semana passada, no qual ressaltou as falsas denúncias de abuso sexual como formas comuns de atingir o ex-parceiro. Oito em cada dez delas são falsas, de acordo com uma pesquisa que ela desenvolveu com dados do Judiciário carioca.

Andreia alerta para os riscos da alienação parental, das formas mais sutis às mais sérias, na vida dos filhos. “As consequências são graves, já que pai e mãe deveriam ser base para o estabelecimento de confiança para a criança e o adolescente. No litígio e na alienação, finda-se sem esta base de confiança, de ambos os pais. Isso pode gerar casos de ansiedade, medos, dificuldades no desempenho escolar, depressão e inclusive suicídio”. 

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Uma forma respeitosa e justa de continuar criando os filhos que ficaram de uma união desfeita é compartilhar as obrigações, o tempo de convivência e a guarda deles. Sancionada no fim de 2014, a Lei da Guarda Compartilhada garantiu que esse regime de responsabilização de ambos os lados passasse a ser prioritário, mesmo quando há conflito de interesses.

Flávia Santos (nome fictício), 37 anos, separou-se do ex-marido há 13 anos, quando o filho que tiveram estava com 2 anos de idade. Na época, não teve qualquer problema em decidir como ficaria a nova relação com a criança. “Foi supertranquilo. Quando a gente entende que a relação marido e mulher é uma coisa e a relação pai e mãe é outra, enxerga essa situação do melhor jeito. Um desses vínculos acaba, mas o outro não.”

O filho do ex-casal tem 15 anos e não teve dificuldades de entender o que houve, segundo a mãe. “Desde que ele era pequeno, explicávamos; aí ele foi crescendo e entendendo melhor. Sempre falamos que não é porque o pai e a mãe não moram mais na mesma casa que vão deixar de cuidar dele”, conta. No caso dela e do ex-marido, Flávia afirma que nunca houve qualquer situação de disputa que respingasse no menino.

O jornalista Ítalo Milhomen, 28 anos, também se separou quando o filho ainda era pequeno. A criança tinha pouco mais de um ano quando os pais tomaram a decisão. “No começo, quando ele era menor, ficava mais com a mãe, não sentia muita confiança de ficar comigo ou com meus pais. Depois que foi crescendo, passou a dormir comigo e hoje temos bem mais contato do que antes.”

O pai declara ser bastante participativo. “Todos os dias ligo pra ele, chamo para falarmos no vídeo, passamos fins de semana juntos, divido todas as despesas dele com a mãe e combinamos algumas situações, como levar ao dentista, médico e cinema, conforme a nossa disponibilidade”. Hoje, o menino tem 3 anos.

FORMALIZAÇÃO

Os entrevistados não procuraram a Justiça para formalizar a guarda porque, até então, o diálogo foi suficiente para mediar todas as decisões que precisam ser tomadas.

No entanto, o que a advogada Ildália Aguiar recomenda é que a guarda seja formalizada. “Formalizar a tutela da criança e do adolescente é o ideal para garantir a eles os direitos como  saúde, boa educação e afetividade. As brigas que existirem entre os pais podem influir nisso negativamente.”

Ildália é presidente da Comissão de Direito da Família, da Ordem dos Advogados do Brasil em Mato Grosso do Sul (OAB/MS), e acredita que a Lei da Guarda Compartilhada e iniciativas que facilitam o acesso ao Judiciário, como a Justiça Itinerante, têm favorecido maior aceitação da guarda compartilhada por parte da população e dissolvido conflitos. “Os avanços que ela representa são a participação paterna e a resolução dos conflitos entre os pais”, finaliza.


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